O governo dos EUA subiu o tom e disse ao governo Dilma Rousseff, em carta, que sucessivos aumentos de tarifas sobre importações poderão manchar a relação comercial entre os dois países, acusou Brasília de protecionismo e insinuou que pode haver contrapartida americana.

A reclamação foi rebatida em tom mais duro do que o normal pelo chanceler brasileiro, Antonio Patriota.

O movimento dá fôlego a uma aparente fricção entre os dois países sobre comércio, encampada pelo ministro Guido Mantega (Fazenda) em entrevista ontem ao “Financial Times”, na qual chamou de “protecionistas” as medidas do BC dos EUA para irrigar o mercado local de dólar.

As queixas americanas, em plena campanha eleitoral, estão em carta enviada anteontem pelo embaixador Ron Kirk, cujo cargo equivale ao de ministro do Comércio Exterior nos EUA, a Patriota.

O documento, obtido primeiro na tarde de ontem pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, foi vazado por diplomatas americanos em Genebra e teve seu teor confirmado à Folha por representantes do USTr -o gabinete de representação comercial dos EUA.

“Os EUA estão preocupados com aumentos de tarifas [de importação] agendados e propostos pelo Brasil e pelo Mercosul”, afirma Kirk.

Ele acrescenta que o aumento de alíquotas que entrará em vigor na próxima semana, sobre cem produtos (inclusive maquinários e eletroeletrônicos), terá impacto negativo sobre as exportações americanas e configuraria, portanto, protecionismo.

“Historicamente, tais ações têm levado os parceiros comerciais a responderem na mesma moeda, o que amplificaria o impacto negativo [das medidas]”, prossegue.
Kirk encerra a carta afirmando aguardar ansiosamente por uma oportunidade de se reunir com Patriota.

O chanceler, por sua vez, disse, em carta, que o país “tem sido obrigado” a enfrentar uma valorização artificial do real e uma enxurrada de importados a preços artificialmente baixos, devido à “expansão monetária maciça e ao resgate de bancos e indústrias”, por parte dos EUA e de outras nações ricas.

Patriota disse que o Brasil “não abdicará de seu direito de fazer uso de todos os instrumentos legítimos permitidos pela OMC”.

E, segundo ele, o aumento das vendas americanas para o Brasil seria “mais justo” se não tivesse ocorrido em um “ambiente que não estivesse distorcido por desalinhamentos cambiais e escancarado apoio governamental”.

Os EUA são o segundo principal destino de exportações brasileiras, com US$ 18,6 bilhões comprados de janeiro a agosto -produtos industrializados, em boa parte.

O Brasil, por sua vez, é um dos raros países com quem os EUA têm superavit comercial.

A comunicação direta por carta em nível ministerial em casos assim é rara.

CRÍTICA BRASILEIRA

Mantega usou a entrevista ontem ao “Financial Times” para criticar a terceira rodada de medidas nos EUA para aliviar a pressão sobre o dólar, anunciada pelo Fed, o BC americano, na semana passada e chamada de “QE3” (de “quantative easing”, ou afrouxamento monetário).

Para o ministro, os estímulos dos EUA -recompra de títulos ligados a hipotecas- distorcem o câmbio global e não incentivam a produção.

“É preciso entender que isso acarreta consequências”, disse Mantega. “O benefício [para os EUA] é marginal, pois não falta liquidez, e essa liquidez não vai para a produção”, afirmou, voltando a acusar Washington de promover “guerra cambial”.

O caso brasileiro -e do Mercosul- é mais um entre as crescentes ações comerciais americanas na reta final do primeiro mandato do presidente Barack Obama, que concorre em novembro à reeleição e promete em campanha ampliar a defesa de interesses comerciais dos EUA.

Em pouco mais de dois meses, o país abriu dois processos contra a China e um contra a Argentina na Organização Mundial do Comércio.O COMÉRCIO DO BRASIL COM OS ESTADOS UNIDOS

Fonte: Folha

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