Um dos debates mais urgentes da atualidade é com relação às medidas para a conservação da vida no planeta. Uma conversa rápida com quem estuda as mudanças climáticas, a leitura, mesmo que superficial das transformações ambientais que estão se multiplicando rapidamente pelo globo, são capazes de delinear um contexto do qual não se pode fugir e que exige pronta reação.

Somos 7 bilhões de moradores, numa era de avançada tecnologia, de necessidades cada vez mais refinadas e caras aos recursos naturais. Somos uma geração que assiste o planeta revidar as agressões que se intensificaram com nossos avós e que temos repetido, seguindo o exemplo de nossos pais. Desmatamos, poluímos, consumimos, aquecemos o mundo com nossa ânsia pela fartura, pelo conforto e pelo luxo. A fatura está sendo cobrada. Aquele que percebem a situação se manifestam em prol da sustentabilidade, os mais prontos e radicais ganham o apelido de ecochatos ou ecotalibãs por parte de quem simplesmente não entende que não podemos galopar sem freios rumo ao precipício.

Foi com espanto que acompanhei a discussão sobre o código florestal brasileiro. A reforma conseguiu piorar o que estava defasado. A meu ver, se a lei da Câmara for aprovada, perderemos até as mais frágeis garantias à natureza e tudo isso pela mão da categoria que mais deveria se preocupar com a qualidade dos recursos naturais no país, os donos de terra.

A lei florestal brasileira remonta à década de 60. Muito antes da preocupação com o futuro ambiental fazer parte da vida das pessoas. Não se falava, como hoje, da necessidade de reciclar, reaproveitar, economizar os recursos, mesmo assim, a lei previa proteção da vegetação que é considerada patrimônio nacional. Na época, o brasileiro já tinha a compreensão de que a continuada agressão às regiões da zona da mata, o desmastamento indiscriminado das florestas que beiravam a costa, foram atitudes que afetaram o clima, tornando o agreste uma região onde a vida tornou-se sinônimo de sofrimento. A lei então surge para bloquear o estrago para outras regiões no país, que começavam a ser ocupadas e exploradas. A ideia era conter a destruição e obrigar quem tira sua riqueza da terra, contribuir para que ela permaneça rica.

O atual código estabelece as áreas de preservação permanente, que não devem ser utilizadas. São elas as margens de cursos de água, as nascentes, os topos de morro e elevações, as encostas, restingas, dunas, mangues, bordas de chapadas, as faixas de vegetação que contenham erosões e dunas, que protegem rodovias, que abrigam espécies que correm risco de extinção e as que são de reserva indígena. Como uma lei dura e exigente, óbvio que também é continuamente desrespeitada. Criou-se uma ampla estrutura para fiscalizar seu cumprimento, mas são notórios os casos de corrupção e subversão do preposto. A evolução do código ambiental caminharia talvez para uma política de incentivo, uma fomentação dos valores de preservação ambiental enquanto também se investisse para cercar ainda mais os infratores. À exemplo do processo evolutivo do combate à sonegação feito pela Receita Federal, o Ministério do Meio Ambiente e todo o legislativo deveriam estabelecer um compromisso para aperfeiçoar os mecanismos de cumprimento da lei. O esforço que se percebe é oposto, requer a flexibilização das regras e flexibilizar, nesse caso, é escancarar a porteira para os abusos e inconsequências.

O setor ruralista é indubitavelmente um alicerce para a economia brasileira e está na base para qualquer desenvolvimento do país. Somos um país de raiz agrícola e ao campo devemos quase tudo. Isso no entanto não pode obrigar a nação a fechar os olhos para a fragilidade dos argumentos do setor ao defender mudanças nocivas. Dizer que o produtor rural vai proteger a natureza por saber que precisa dela é contar demais com a ingenuidade de quem sabe que o capitalismo costuma gritar alto nestas questões.

A lei não pode anistiar desmatador. A lei não pode abrir mão de responsabilizar quem lucra com o desmatamento. Ouvi um ruralista dizendo que o produtor rural tem arcado sozinho com o custo das APP. Ora, essa é a condição de seu negócio! Não se pode é tranferir o custo para a coletividade e para gerações à nossa frente, enquanto o lucro se concentra nas mãos dos donos da terra. Lidar com o bem natural hoje, exige sim uma dose de responsabilidade que deve suplantar a que havia no passado.

Não canso de ouvir estudiosos e especialistas defenderem que nenhuma árvore precisa cair para que a produção de alimentos no Brasil aumente. Basta inteligência e tecnologia no campo, basta recuperar áreas degradadas. Jugo que a ameaça de escassez que a vaidade ruralista lança no debate para defender suas pretensões só existe se essas mesmas pretensões forem atendidas. Se não estendermos a preservação de nossos mananciais, se não zelarmos por nossas nascentes, e pela riqueza subterrânea que são os aquíferos, não seremos capazes de honrar nossa missão de abastecer o mundo.

Felizmente já se levanta no Senado Federal um movimento para corrigir o equívoco egoísta aprovado pela Câmara de Deputados. É um sinal de bom senso de quem foi eleito para defender os interesses do país. Agora também acredito que o projeto mutante, desvirtuado que foi aprovado sob as bençãos dos enriquecidos deputados ligados à exploração da terra não passará pelo crivo da presidenta Dilma. Ela já provou bom senso em diversas frentes e acredito que agora não será diferente.

César Augusto Machado de Sousa é Apóstolo, Escritor, Radialista. Escreve todas as terças-feiras para o DM. E-mail apostolo@fontedavida.com.br

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