Desde dezembro, a Suécia é o primeiro país do mundo com uma religião que considera a internet sagrada, reconhecida pelo governo. Para a Igreja Missionária Copimista, copiar e espalhar conhecimento sem barreiras é um direito de todos.

“Nós queremos viver num mundo em que todas as pessoas tenham acesso a todas as informações, em que ninguém seja excluído. Copiar é um ato divino”, diz o estudante de filosofia Isak Gerson, 20, fundador da religião junto com Gustav Nipe, 23.

Os dois vivem em Uppsala, 70 km ao norte da capital, Estocolmo, e se conheceram na Juventude do Partido Pirata, do qual Nipe é o líder local.

Eles criaram o copimismo em 2010 e, desde então, buscavam o reconhecimento do órgão que regula as atividades religiosas na Suécia. Após três tentativas frustradas, o movimento foi aprovado no dia 21 de dezembro.

O nome da igreja é uma corruptela do inglês “copy me” (em sueco, “kopimi”), e o símbolo é a letra K dentro de uma pirâmide. Os copimistas ainda não têm sede física, e os cultos acontecem on-line. Por enquanto, os únicos pastores são Gerson e Nipe.

“Nós discutimos uma série de assuntos, trocamos dados e espalhamos para que outros tenham acesso. Não temos um Deus ou santos, mas, no fundo, não somos muito diferentes do cristianismo, que também prega a partilha. Acho que todos conhecem a parábola da multiplicação dos peixes. Nós acreditamos nos mesmos princípios”, afirma Gerson, que vai à Igreja Luterana duas vezes por mês.

Nas primeiras três semanas de vida, os copimistas superaram 5.000 membros, mas tiveram receptividade maior no exterior que dentro de casa. Quinze países já criaram paróquias copimistas, e os fundadores dizem ter sido contatados por brasileiros.

LEI ANTIPIRATARIA

Na Suécia, porém, o copimismo foi acusado de ser uma estratégia para usar a liberdade de religião como defesa contra a rigorosa legislação antipirataria local, que prevê multa e até dois anos de prisão para quem copiar arquivos protegidos.

“Não considero o copimismo uma igreja, mas, quando as regras para o registro de um religião foram estabelecidas, sabia-se do risco de abusos como esse. Eles não adquiriram nenhum direito a mais por causa disso. A liberdade de expressão, ou liberdade de culto, nesse caso, continua sendo regida pela legislação geral”, diz o pastor metodista e ex-deputado Pär Axel Sahlberg.

“Buscamos o registro oficial por acreditar que temos os mesmos direitos que os outros cultos. Sabemos que copiar arquivos pela internet, infelizmente, não vai deixar de ser ilegal por causa disso. Muitas igrejas também sofreram perseguição parecida no início”, defende-se Gerson.

A Suécia é um dos países menos religiosos do mundo. Numa pesquisa realizada pelo instituto americano Gallup em 2009, apenas 17% dos suecos disseram que a religião é parte importante de seu dia a dia, ante 65% nos EUA e uma média mundial de 82%. No Partido Pirata, o copimismo divide opiniões.

“Alguns não concordam com a ideia de misturar política e religião. No início, eu também desconfiei. Agora, vendo a repercussão, acho que o copimismo pode ser algo positivo para nós. Mas não sigo religião alguma nem pretendo me juntar à igreja”, afirmou a líder do Partido Pirata, Anna Troberg.

Origem da igreja, Partido Pirata vive crise

Seis anos após a fundação, em janeiro de 2006, o Partido Pirata sueco, de que saíram os fundadores da Igreja Copimista, vive a primeira crise existencial.

A legenda deixou de ser novidade, mas não conseguiu se estabelecer na política local por causa da imagem de partido “de uma nota só”: a luta contra a indústria dos direitos autorais. Para superar essa barreira, quer seguir o exemplo do Partido Verde.

“Assim como os verdes fizeram com a ecologia, queremos ampliar o discurso para outras áreas, não só para proteger os cidadãos contra tentativas cada vez maiores de controlar o que fazem”, diz a líder Anna Troberg.

Em 2009, o Partido Pirata teve resultado surpreendente nas eleições suecas para o Parlamento Europeu, com 7,13% dos votos, que valeram duas cadeiras em Bruxelas.

No entanto, 15 meses depois, não passou de 0,65% nas eleições para o Parlamento da Suécia, muito longe dos 4% necessários para eleger um deputado. “Acho que foi uma mistura de vários fatores. Certamente nos faltou experiência”, avalia Troberg.

O cientista político Mikael Persson, da Universidade de Gotemburgo, acredita que o Partido Pirata ainda está muito distante de um lugar no Parlamento local.

“A eleição europeia não é considerada tão importante, por isso os eleitores arriscaram mais”, diz.

Fonte: Folha de São Paulo

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